domingo, 22 de janeiro de 2012

Viver Colectivo

Hoje quero falar-vos sobre a experiência de partilhar casa/quarto. Quando vim estudar para Évora, devido a questões monetárias (e porque nos filmes há sempre grandes histórias em residências universitárias), fui viver para uma residência de estudantes, mista! Éramos poucos, 26 pessoas divididas por dois pisos, praticamente por nossa conta. O choque inicial não foi fácil, ao contrário do que esperava. Estava habituada a um quarto só para mim, ninguém me chateava, tinha um espaço MEU! Mas, com 17 anos sabia lá eu o que era a verdadeira convivência social, o estabelecer limites, o fazer-me ouvir. Comecei por dividir o quarto com mais duas alminhas, que foram alternando com o passar dos meses. Para além disso, dividia obviamente todos os restantes compartimentos. Era das mais novas da casa, pois quando cheguei habitavam naquele espaço alunos já quase no fim de curso, com experiências acumuladas ao longo dos anos, com diferentes personalidade e formas de estar na vida. No início, passava grande parte do meu tempo fechada no quarto ou na rua, por entre idas ao cinema, jantares, passagens por lojas de roupa, cafés, passeios banais. Custava-me um bocado ter que me partilhar com tanta gente que não conhecia de lado nenhum.
Passado esse tempo de adaptação inicial, em que ponderei sair... descobri a grande aprendizagem e a grande recompensa de nos darmos a conhecer e sobretudo de nos conhecermos a nós próprios. 
Aprendi que não sou tão anti-social como pensava, aprendi que é possível compreendermos os nossos limites, respeitá-los e fazê-los respeitar. Aprendi sobre a importância do silêncio e do barulho (vulgo, rambóias*), sobre a importância do estar junto e do estar só, a importância do pedir e do oferecer. Aprendi i verdadeiro significado da AMIZADE. Aprendi que no mundo real não é tudo tão linear e concreto como às vezes pensamos, que não existe só pessoas boas e pessoas más... às vezes há pessoas assim, assim e cabe-nos a nós perceber que vale a pena ou não apostar no lado bom de determinada pessoa. Aprende-se que os amigos não são apenas pessoas com quem se chora, com quem se passa muito tempo, com quem se ri e se faz asneiras. Aprendi que os amigos são muitas vezes aqueles que nos mostram a mais dura verdade, mesmo que isso nos custe horrores, porque acreditam em nós, no nosso potencial humano e querem-nos ver crescer e singrar na vida. 
Os anos passaram e entretanto coube-me a mim passar parte destas aprendizagens aos que chegavam. Devo dizer que a cada ano que passava a tarefa se ia tornando mais difícil, explicar a um adolescente a importância de lavar a loiça após sua utilização, de limpar a casa-de-banho após o duche, de não fazer barulhos infernais às 5 da manhã... tratava-se não de ser perfeito e piroso, mas de RESPEITO. Explicar que existe tempo de party e tempo de sossego, que existem pessoas com rotinas diferentes, que mesmo que eu seja dura, cruel no início... isso não quer dizer que seremos inimigos mortais para sempre. E posso dizer, que na maioria das vezes, fiz um bom trabalho.
Hoje já não vivo nesse contexto, mas fui tãooooooo feliz nesse lugar! As conversas pela noite dentro, os sonhos partilhados, as desilusões que nos dilaceravam ficavam ali, por entre pessoas de pijama a beber chá e a contar histórias hilariantes. Não ficaram todas as pessoas da mesma forma no meu coração... mas ficaram muitas e ficaram os momentos, de companheirismo leal, de entre-ajuda. Ficam as recordações de gargalhadas, dos churrascos, das invenções culinárias, das noites de cinema na varanda, do cheiro desses tempos. Tenho saudades, embora isso não queira dizer que gostaria que o tempo voltasse atrás...!
Isto tudo para dizer que se entra na universidade, não só para se tirar um curso de Química, de História, de Matemática ou se sair Engenheiro... tiram-se lições de vida importantes! E não é que é mesmo verdade que amigos de faculdade são amigos para a vida ? :)

* rambóias: bebedeiras descomunais que colocam em risco a vida da personagem e de todas aqueles que se cruzam com o mesmo durante esse período; actividades lúdicas com níveis de barulho capazes de ensurdecer uma cidade inteira.

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